Fazer gestão de
problemas, e não de soluções, torna a dependência das decisões do poder
público em justificativa para insistir em irregularidades e para impor
condições favoráveis a conflitos e violências condenáveis na
justiça e na moral. O empresário que monta sua equipe
com capangas e dá a ordem para atirar em índios já decidiu que
seus produtos não podem ser classificados como sustentáveis, muito menos
certificados, para serem vendidos para Europa, Estados
Unidos, Ásia. É o preço a pagar que ele mesmo bota nos métodos
arcaicos e tacanhos de gestão do seu negócio, e essa responsabilidade por
denegrir o made in Brazil é intransferível.
O caminho para um
agronegócio sustentável no Brasil,
ou em qualquer lugar do mundo, requer diagnósticos e adequações a critérios
objetivos para as materialidades
da cadeia produtiva, o que beneficia a economia,
o meio ambiente e a sociedade. Como vendemos para o mercado externo, não é
desconhecido, especialmente para os grandes produtores rurais, o conjunto de normas internacionais para práticas ambientais,
trabalhistas, sociais, de bem estar animal e de gestão. A certificação exigida para exportação tem
impactos positivos no mercado
interno, então, também não são desconhecidas do setor as conformidades para sustentabilidade já adotadas
aqui por bancos e compradores.
A campanha de boicote ao
agronegócio de Mato Grosso do
Sul, motivada pela violência crescente aos Guarani Kaiowá por parte de produtores rurais em
situação irregular em Terras Indígenas, é uma pressão legítima em defesa da vida
e de direitos. Resposta da sociedade
à omissão do governo federal que
permite o que se caracteriza como genocídio, é uma ação de mobilização social propositiva
de mudança que colabora também para expansão da agropecuária sustentável no Brasil. Soja plantada em Terra Indígena
invadida não é sustentável, carne de boi que pasta em Terra Indígena
desmatada não é sustentável. Essa classificação não é inventada, resulta das
decisões de gestão que carregam a responsabilidade por métodos socioambientalmente
insustentáveis e com riscos econômicos e jurídicos.
Irregularidades em Terras Indígenas e desmatamento ilegal são práticas inadmissíveis
sob normas internacionais, que não estão em conformidade com critérios e aspectos legais de sustentabilidade,
seja para certificação, financiamentos ou comércio.
O empresário do agronegócio que mantém situação irregular em
Terra Indígena cria e assume o risco de sujar a reputação da sua produção, arcar com possíveis prejuízos
decorrentes, afetar negativamente a imagem
do país e comprometer o avanço de um modelo de economia que pressupõe ética e respeito, é uma prerrogativa de
gestão.
E não tem
desavisado nessa história secular de bala contra flecha e
árvore. Tanto que no capítulo Gestão do Guia
de Práticas para Pecuária Sustentável do
Grupo de Trabalho da Pecuária Sustentável [GTPS] é recomendado que o
"empresário precisa ficar atento à presença de terras indígenas"
e informado que qualquer "irregularidade envolvendo estas terras podem
impactar diretamente as operações da propriedade". A pressão sobre
bancos e frigoríficos é reconhecida como forma de combater irregularidades, com
o alerta de que são evitados negócios com propriedades
rurais em que ocorrem
problemas ou com problemas associados a elas ou até próximos, tanto em relação
a Terras Indígenas quanto ao desmatamento ilegal. Isso quer dizer que um
único produtor fora dos conformes é capaz de prejudicar os outros e dar má fama
à vizinhança que optou pela gestão
sustentável de seus
negócios.
Sustentabilidade no agronegócio brasileiro faz diferença daqui
para fora. Por isso, aliás, a aprovação da PEC
215 deveria ser avaliada pelo
setor como uma grave ameaça aos negócios internacionais em
conformidade com práticas sustentáveis. Com a transferência da soberania do
Estado sobre a demarcação de Terras Indígenas do executivo para o legislativo, o Brasil vai ser
posicionado como um mercado em que sequer a Constituição é respeitada e no qual se
oficializa o desrespeito a direitos para legalizar a produção fora de
conformidade, o que é incertificável. A proposta é tão surreal que não mensura o tamanho da insegurança
jurídica e o potencial de
instigação e aumento de conflitos,
ignorando que as consequências podem ser dramáticas [estamos falando de gente e perdas de vidas] e institucionalmente
danosas ao nosso país.
Quem vai certificar a sustentabilidade de qual produto num lugar desses?
Só
lembrando: Todas as Terras Indígenas deveriam estar demarcadas e homologadas no
Brasil desde 1993, conforme a Constituição Federal.
Para acompanhar a iniciativa de mobilização no facebook { http://bit.ly/CPIdoGenocidio
Para acessar os banneres da campanha com legendas em 3 idomas { http://bit.ly/CampanhaboicoteagronegocioMS
Saiba mais sobre o contexto de violências contra os indígenas em Mato Grosso do Sul:
Artigo Os condenados dessa terra, do Prof. Dr. Neimar Machado de Sousa, publicado no Portal EcoDebate { http://www.ecodebate.com.br/2015/10/13/guarani-e-kaiowa-os-condenados-desta-terra-artigo-de-neimar-machado-de-sousa/
Matéria da Carta capital “Omissão assassina no Mato Grosso do Sul - O governo e a Justiça têm culpa no conflito sangrento entre índios e fazendeiros”, de Rodrigo Martins, publicada em 09/10 { http://www.cartacapital.com.br/revista/870/omissao-assassina-6689.html
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